quarta-feira, 29 de abril de 2009



As vezes uma imagem vale mais que mil silêncios...

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Dique de cores flutuantes


Por Flávio Viegas Amoreira
“Quem nasce num porto de mar tem tudo para ser sábio” Paulo Mendes da Rocha (arquiteto)


Novas cores para o pós-tudo que enfrentamos. Assim emocionado li a matéria de 11 de abril de A Tribuna: Arte deixa a Vila Gilda com as cores da esperança. Inteirações estéticas, superfícies líquidas, soluções movediças para um universo em transe: o risco das marés reentrantes agora tonalizadas de cores iluminando o Rio Bugre. Uma exposição impermanente , Cores no dique foi idéia concretíssima do artista plástico e filósofo santista Maurício Adinolfi, projeto aprovado pela Funarte e que mobilizou comovidamente os moradores dos barracos sobre palafitas do dique, braço de mar que abraça essa nossa ilha (in) comum. Folhas de madeirite simetricamente esquadrinhadas tingindo de poesia o cotidiano reinventado dessa gente valorosa que persegue ainda o mito de morar onde o Oceano vai querendo preencher seu espaço. Habitações de nobreza lírica. Que dignidade nesse empreendimento convergindo sonhos, perspectivas e o maior desafio do Homem: a capacidade de ainda dar sentido ao encanto. Nenhum paternalismo: o artista coordenou sua visão amplificando sua percepção com o entusiasmo dos agentes e protagonistas desssa metamorfose urbanística de dimensão global apartir da interferência nas peculiaridades da vivência ribeirinha local.

Nenhuma transcendência me balança tanto quanto a beleza imanente: nenhuma carência é mais urgente que a do espírito saciado plasticamente pela mutação do instante. Casas-navegantes: dormentes que sustentam Mondrian e Kandinsky pelos manguezais de Santos! Ludicamente compostos, os barracos ganham matizado sinestésicos da maresia. Nenhum arranha-céu da burguesia me move tanto à persistência quanto o arquipélago onírico da Vila Gilda. A Arte é a religião dos sem fé além da fé no humano: o pintor que vai pincelando almas, traçando esboços impactados nas águas salobras do horizonte. A experiência da arte não simplesmente uma passiva recepção sensorial tranqüilizante: Arte para quem de tudo precisa no ofício impreciso da Vida. Maurício Adinolfi imprimiu o dique de azul-futuro; simbólico empenho: o real soçobra enquanto a minha crença vem do universo-dique, arquipélago arco-irís que não se desmancha: desdobra no canal mirando a costa ampla. Cores no Dique: deu-me orgulho “viver” santista; povo do dique perseguindo o enfrentamento das marés; bravos sujeitos de sua História.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

NASCERÁ DE UM MESTRE



para o peixe pouco importa o simbolismo das flautas

peixe negro dentro de um mestre

a arvore compreende o nome dentro da sombra o homem dentro

o mestre

disse

não há caminho no meio do nome posso aventurar-me a perguntar as flautas da terra as flautas do céu o que nada significa disso o grande labrego explode no ar e seu nome é vento sob as oliveiras chorei morro amanhã nos espinhos sabem meus pés descalços os lírios sem a tristeza dos campos entorno onde ninguém compreenderá tudo isso estava escrito nas quedas da paisagem desse corpo dilacerado que estremece e o silêncio continuo




Felipe Stefani.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Foram publicados alguns poemas meus no saudoso Jornal de Poesia http://www.jornaldepoesia.jor.br/ Não deixem de conferir.

http://www.jornaldepoesia.jor.br/felipestefani.html


Grande Abraço a todos,

Felipe S.

domingo, 19 de abril de 2009

Margens...


Paul Gauguin. The Great Buddha. 1899.

"Pois assim como este amedrontador oceano margeia a terra verdejante, também na alma do homem se encontra uma Taiti insular, repleta de paz e alegria, mas rodeado por todos os horrores da existência parcialmente conhecida. Deus te proteja! Não desatraques dessa ilha, pois não poderás voltar jamais!"


Heramn Melville, Moby Dick. Cap. LVIII.

sábado, 18 de abril de 2009

José Lezama Lima.



"A poesia é como o ar, toca o homem e o define, lhe dá figura e contorno porém o ar é irrepresável. Um dos milagres da poesia é que toca o fogo e é ao mesmo tempo o fogo transfigurado. Isso não deve nunca esquecer o poeta."
José Lezama Lima




E- Duplo erro, sedento

O erro compreende a sua figura
no centro novo e na esfera nova.
Duplo erro, sedento
movem-se os números na parede
da recordação exata e as boas-vindas.
Risco novamente aquelas letras
do convite com que amanheciam
as nuvens novas e a dulcificada
roda da tortura.
Onde se alojaram os mistérios,
as noites gêmeas e as coleções
de ídolos perenes?
A roda da poderosa nuvem imperial
o parafuso já não golpeia
as costas densas.
O parafuso que rompe o mar em dois:
os poderosos deuses abolidos
e o presságio que toca e persegue.
Gira a nuvem sob o sonho
e ali investe contra novos reinos
da pronunciada melodia.
Depois do cordeiro recém-nascido
sem perguntas na apaziguada prata,
os impérios do carvão, os nebulosos
paraísos sem proporção e justiça.
Aqueles que esquecem que a elegância,
veado alimentado de orvalho ou polpa de neve
cortesã, é o ser iminente que penetra
na nuvem central, o corpo da amêndoa:
a soberania celestial do fogo em evasão.
Fugia da terra grávida,
sedento Marco Pólo entre carbúnculos,
estabelecendo os limites do sonho vago.
Acreditava que encontraria entre as rochas douradas
o peixe ainda sonâmbulo e separado
- única espécie de um metal vivo -
da noite e a sua sombra dançante.
Ali nas flautas a maldição nascente
e a nova cidade do corpo em fúria,
as pontes sombrias onde animais de canela
destroem na noite as coleções de porcelana.
Aberta ali, no instante em que a flor
assimila e se une ao inseto,
grandes pirâmides de orvalho
o golpe que engendra o cravo.
Ecos desabam, rumoroso presságio,
recua a extensa coluna de um fogo trêmulo
incha em ti, soluça o murmúrio,
invoca a ternura dos véus da água.
E as ninfas entre água e escuridão
transbordam de graça e som, os seus mantos,
os cabelos eternos diante do espelho, dizem:
define-me, não é nos meus passos, é na estátua
onde o tempo me devora e na areia
que cai das mãos que está o tempo predileto,
o único tempo criador sem o seu par e não o flanco
sangrando até o crepúsculo, e à nossa frente:
a estátua desconexa e um só centro .

A cavalaria provoca um remoinho
e se inclina à vista das águas não tocadas
a lua o inseto, e o cavaleiro.
O que declina à deriva até o centro.
O nu se nutre dos seus vestígios.
A lua, sonho duplo da lua vagarosa,
desce tocando as folhas diante dos amantes.
As folhas pintadas pelos címbalos do exílio
fabricam a areia e deslocam a chuva!

(Trad. Jorge Henrique Bastos)



José Lezama Lima. Fonte: http://www.culturapara.art.br/opoema/opoema.htm


Felipe Stefani.

terça-feira, 14 de abril de 2009



No verso estou vivo, estou sonhando.
Trabalho por dentro, nalgum lugar noturno,
visto do alto lembra um supremo silêncio.
Onde às vezes chegam os mortos
há noites esplendorosas.

Fixo na idade da treva,
para alguém que me queime contra as eras do meu grito,
alguém com mãos antigas,
ao longo de sons sempre espantosos.

Por vezes trago um Deus, estremecido,
trago um mito por dentro.
Até alguém que me alcance do alto,
com as mãos quentes da noite
que se esgota nos mortos.

Tremo, escrevo, ardo, até fixar a treva.
A tristeza de Deus é um modo de ritmo.
Estou girando, em ilhas, quem me soletra
vem do alto e delira,
desde a distância até o fim do pensamento.



Poema e Desenho de Felipe Stefani.

quarta-feira, 8 de abril de 2009



a noite incendiou-se
nos poros súbitos da epifania

corpo de raízes vermes
caules na água de um itinerário de assombros
corcel cego
o cio derrama-se no âmago sem margem
refletida febre galga
a escultura do delírio

e no semblante da orgia
com destino forasteiro entre
fleches de neon exílio
correntezas
a volúpia da dança
extenuante guarda no estigma das marés
precipício inominado
urdido à finitude da inexistência

enfim
tombando entre raízes de paisagens naufragadas da noite
celebraremos outra vez os meteoros

e findos

nascemos

...

Felipe Stefani, Abril de 2009, depois de uma noitada delirante.